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Odisséia Uruguaia IV

De como eu fui parar em um inferninho chamado Fechoria´s

Agora que me encontro um tanto quanto ébrio, acho que minha língua, quer dizer meus dedos se soltam. Vou até contar uns lances que me oc, credo que difícil achar as letras assim, vou até contar mais um lance que me ocorreu na minha famosa odisséia urugaia, uruguaia, é assim mesmo? Deve ser.

Bom, depois da apresentação de dança contemporânea das meninas no Teatro Espanha em Melo, acabei cruzando a fronteira de volta para Jaguarão e pensei que ia haver festa lá, mas que nada! As gurias acabaram dormindo na van na hora que durava o trajeto e pude me dar conta da burrada que fiz. Fiquei sabendo depois que um amigo que tinha ficado lá curtiu bem mais a noite uruguaia de sábado com o cara que fez a iluminação do espetáculo e vinha de Montevidéu.

Continuando, passei o resto do sábado em uma festinha meia boca no Jaguarense e o domingo meio na merda, sem muito rango à disposição, sozinho com apenas um canal de televisão disponível, a Rede Globo (sinal onipotente é isso aí) e chuviscos incompreensíveis de uma TV uruguaia.

Na segunda-feira Abelardo, esse só vendo pra crer, uma coisa magra e cabeluda, com um nariz digno do descrito pelo Gogol, um baita bailarino no fim das contas, me dá um troco para pegar o táxi para ir até a magnífica rodoviária de Rio Branco, do outro lado da ponte e tomar ônibus para descer no Km 75 da Carretera para Melo. De lá eu esperaria até que a Rosana e o Joselo fossem me apanhar de carro. Era para ficarmos um dia nas terras do pai dele e voltar em seguida.

Acabamos ficando até quinta à tarde. Só então fomos para a cidade de Melo, a última escala na volta para Jaguarão, para falar com um pessoal da TV local e iríamos embora mais tarde naquela noite mesmo. Estava tarde, devido a um fato que pode ou não ser narrado em outro relato desses ficamos de dormir na casa de Joselo na cidade e seguir viagem no outro dia.

Estávamos eu, Joselo, Rosana e o primo dela, Juliandro, o percussionista que acompanhava o uruguaio, seu nome quase fazia dele quase meu xará. O casal ia dormir cedo mas não sem antes me liberar a chave do carro para dar umas bandas em Melo. Circulamos atrás da casa de um amigo de Joselo e como não encontramos, abastecemos o carro e voltamos para o centro da cidade a procura de um bar para passar o resto da noite.

Fomos até um boteco ali por perto, que ficava numa esquina, desses com as mesas na calçada. Momento cultural à Tarantino: uma coisa bem interessante do Uruguai é que lá a garrafa de cerva tem 1 litro, imagine quatrocentos emê-éles a mais! Perto da nossa mesa estavam alguns uruguaios da cidade que conversavam animadamente. Um deles, conhecido de Juliandro, acabou puxando papo conosco. Conversamos pouco com eles.

Não tínhamos esperança de encontrar companhia feminina naquela noite, havíamos sido rechaçados por umas meninas da cidade quando paramos numa pracinha para pedir informação a respeito da rua da casa de Fred.

Acabamos topando sem querer com Fred e sua esposa, o amigo motoqueiro e maconheiro, por pura coincidência. Andavam de moto e passaram pela esquina, Juliandro acabou fazendo-os parar e tomar um traguinho conosco.

Nossos vizinhos de mesas discutiam música. Eles achavam Renato Russo uma merda, por outro lado Fred e sua mulher achavam o nosso falecido compositor o maior poeta e que eles deviam aprender mais sobre música antes de falar besteira. Quase uma discussão boba vira caso de polícia. Antes de tudo virar uma zona a mulher dele sugeriu que fossemos até a casa deles.
Eles deixaram a moto em casa e me perguntaram se queríamos ir a outro lugar que eles conheciam para tomarmos mais umas cervejas de 1 litro.

Conheci o cachorro deles, um grande pastor capa preta simpático, cujo nome me foge à memória. Esse casal de loucos costuma viajar de moto pelo Brasil inteiro e vi numa foto que me mostraram de uma dessas viagens o cão em cima do tanque de gasolina, feliz da vida com a língua ao vento junto dos donos. Só faltava uma jaqueta de couro e um capacete para ele, daqueles com ponta de ferro como dos alemães da 1a Guerra, para ele ser um Hell´s Angel.

Cruzamos metade da cidade e quando vi estávamos num inferninho chamado Fechoria’s. De fora parecia um boteco bastante normal com mesas de sinuca, com as ocasionais brigas que haveriam de rolar de vez em quando. Mais tarde deu para perceber que era um antro de prostituição. As pistoleiras de lá são bastante similares com as daqui. Uma delas se oferecia para um cliente no balcão e não era nem um pouco bonita. Como já era bem tarde da madrugada o cara não quis o programa e nossa hora estava chegando.

Ficamos lá um bom tempo e confraternizamos com alguns dos freqüentadores que nos eram apresentados pelo Fred. Eu, que mesmo sabendo falar o idioma, raramente me comunicava em espanhol, me fazia fluente na língua deles. Uma coisa que percebi de diferença dos uruguaios para os argentinos é que os últimos não fazem o menor esforço para entender o português e quando entendem ainda assim se fazem de desentendidos. Como? perdon? e a fatal: no compreendo. Já os uruguaios, pelo menos os que conheci, se não falam português pelo menos entendem o que se diz para eles na nossa língua.

Eu estava chumbado, cansado e precisava dirigir de volta, sem falar que estava longe de casa, sem carteira de motorista e nem conhecia a cidade direito. Não vi um policial o dia inteiro e não gostaria de conhecer a força da lei de lá. De alguma forma, encontrei o caminho da casa onde estávamos hospedados.

Juliandro ficou no quarto com a tia Ester, jurando que estava sendo esperto, pois encontrou uma cama prontinha para ele, mas eu dei a sorte grande: um quarto particular e uma cama de casal só para mim. Dormi até a metade da tarde da sexta.

As tias, a outra era a mãe de Joselo, eram as mais queridas e nos ofereceram comida assim que acordamos. Que vidão! No meu quarto vi aquela emissora que em Jaguarão eram apenas chuviscos e pude me divertir bastante com os noticiários que relatavam os cacerolazos e a queda do Fernando deles e algumas novelas locais, que não perdiam de jeito nenhum para as melhores mexicanas do SBT. Acho até que vi um capítulo inteiro de Carrossel Dos, pena que a Thalia não fazia parte do elenco.

Nem acreditei que voltávamos para Jaguarão naquele dia mesmo. Na viagem de volta colocamos o casal a par de nossas aventuras na divertidíssima noite de Melo. Nada mal para uma balada de quinta-feira num país vizinho.

Escrito, produzido e dirigido porLeandróide às 11:13:00 AM  

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