Rádio

Terrir

Tive a oportunidade de ver Grite Blácula, Grite (Scream Blacula Scream, de 1973. Também conhecido como Blacula is beautiful), continuação do clássico do terror blaxploitation Blácula. Quer coisa mais B que juntar os dois gêneros? No elenco William Marshall e Pam Grier, a rainha suprema dos filmes black dos anos 70 que tentou voltar ao auge no menosprezado Jackie Brown, de Tarantino. Pam é Lisa, uma sacerdotisa vudu cujo rival para se vingar dela, já que é eleita a nova madre superiora do terreiro, ressuscita os ossos de Blácula. A partir daí dezenas de pescoços serão perfurados pelos caninos pontudos dos mortos-vivos. Haja estaca para tanto coração de vampiro.

O filme é sério e, surpreendentemente, os efeitos especiais não são tão toscos. A transformação do vampiro em morcego é feita apena com as propriedades óticas do negativo. O pequeno morcego cruzando a noite convence até o fã mais ávido por computação gráfica dos filmes de hoje em dia. Voltando a trama, o conde chupa o sangue de uma galera de amigos dela mas a deixa viva para ajudar a despachá-lo de volta para o além por meio da magia negra (sem trocadilhos). No fim ela salva a noite, mata o conde e tudo volta a anormalidade usual.

Escrito, produzido e dirigido porLeandróide às 11:16:00 AM 0 comentários  

Fogo no mercado

2005. Sexta, 19 de agosto. 8:30 AM. Eu dormia no escritório e acordei com o cheiro muito forte de queimado. Algo a ver com o sistema límbico, um mecanismo inconsciente de autopreservação. Ainda bem que o meu estava em dia, apesar da ressaca. Fui verificar meus equipamentos que tinham passado a noite ligados. Imaginei o monitor do computador faiscando. Uma vez queimei um estabilizador e o perfume era parecido. Não era ali dentro a fonte desse odor. Era fora.

As cortinas estavam fechadas e ao abri-las vi de onde vinha aquele cheiro realmente muito forte de queimado. E o calor quando abri a janela. Era o teto da ala norte do mercado público pegando fogo. Em 5 segundos, o meu instinto jornalístico-oportunístico se apossou e quando vi estava empunhando minha câmera de vídeo para registrar o crepitar das labaredas. O estalar das telhas queimando tinha algo de sinistro e o fogo do canto mais próximo da minha janela estava se alastrando para todo o comprimento do telhado.

Com o tempo ficou impossível permanecer lá. Fumaça negra tornava o ar irrespirável. Tive que evacuar o recinto e descendo as escadas com a câmera ligada, vi uma mangueira saindo do hidrante do prédio. Sempre achei que seria para usar nele mesmo, já que era um prédio dos mais antigos da cidade. O segundo mais velho e sua fiação elétrica já tinha dado sinais de entregar os pontos, pelo menos no 5° andar certa vez.

Na rua dezenas de populares se aglomeravam na entrada do edifício e tomando a rua Jerônimo Coelho que era fechada para trânsito de veículos. Descrentes no que viam, comentavam acerca dos estragos visíveis. Os bombeiros tinham chegado rápido e estavam tentando combater o fogo com suas mangueiras. Aguavam o teto e as lojas do lado de uma das entradas. Um dos funcionários de uma das lojas dos turcos, com uma mangueira tentava molhar o teto e o interior e a frente da loja, de forma a diminuir a quantidade de itens perdidos.

A versão que corria dava conta de que o incêndio teve início por volta das 8 da manhã. Uma funcionária de uma lanchonete do mercado tinha esquecido uma fritadeira ligada na cozinha do andar de cima, que pegou fogo e rapidamente se espalhou. Algumas semanas depois a perícia confirmará o que houve no laudo oficial.

A imprensa já estava lá cobrindo tudo. Sabe como são esses profissionais, não podem ver desgraça que tem que urubuzar, é seu ofício. O espetáculo das chamas e as minhas lentes invocaram o espírito exibicionista de um cara que nunca tinha visto na vida e que me perguntou se podia fazer uma locução em cima das imagens que eu registrava avidamente. E ele fez, em português e inglês. Depois me passou um cartão que perdi no meio da confusão. Essa locução estará no meu documentário.

Na outra ala, o pessoal já retirava botijões de gás dos seus estabelecimentos para a calçada. Era ali que se concentrava a maior parte dos bares e restaurantes do mercado, cujos donos já estavam ressabiados pelo apagão de 2003, que fez com que alugam-se caminhões refrigerados para não perder seus estoques de perecíveis. Nenhum prejuízo tiveram dessa vez. O fogo ficou restrito a outra parte do mercado público.

Logo todo o perímetro em volta da ala que queimava estava isolada dos curiosos por policiais e fitas zebradas. Fui para o outro lado ver como estava o combate às chamas. Das janelas do segundo andar de um colégio que ficava num prédio que era do tamanho de uma quadra pendiam mangueiras para os bombeiros. Um bombeiro na torre do mercado com uma mangueira de um caminhão deles fazia o que podia.

A coisa ia mal. O céu estava cinza e preto. Do outro lado da ponte podia-se observar a fumaça subindo. Alguns hidrantes, além da dificuldade de se remover as tampas, não tinham água. As lojas no térreo tinham fechado suas portas. A comoção ainda era grande. Um bêbado como sempre presente em situações assim gritava: “água, eu quero água.” Houve um princípio de tumulto quando identificaram um sujeito numa tentativa de saque. A polícia interveio e dois caras em momentos diferentes levaram tapas e empurrões dos PMs. Foram embora reclamando de agressão. Isso também poderá ser conferido no documentário.

Era hora de voltar para o escritório. Precisava ter certeza se tinha fechado a janela antes de sair. Fui impedido pela policial que isolava a Jerônimo na esquina com a Felipe Schmidt. Ia precisar uma semana para o cheiro sair se a fumaça tivesse penetrado pela janela aberta. Como tenho mais sorte que juízo a janela estava fechada. Por falar em janela, a minha tinha algumas rachaduras antigas nos vidros e nada aconteceu. Na vizinha do lado, o vidro tinha trincado com o calor.

Ninguém se feriu que eu saiba. Precisaram de toda a manhã para controlar o incêndio. À tarde quando pude finalmente voltar para minha sala, registrei também o rescaldo. No que sobrara da cobertura, que agora desprovida de telhas exibia uma carcaça de madeira e metal que servia como viga e o corredor e os boxes das lojas lá embaixo, 2 ou 3 bombeiros se equilibravam para aplacar o calor com mangueiras.

Escrito, produzido e dirigido porLeandróide às 5:56:00 PM 0 comentários